Quando o fim não satisfaz

Foto por Sigmund

Você está na sala de cinema assistindo aquele filmaço. O roteiro é incrível, as atuações são brilhantes, figurino impecável, mas… que fim ruim

Você está terminando uma das melhores leituras do ano. Já se imaginou várias vezes recomendando o livro para os seus amigos, mas… O último capítulo é como um trem desgovernado que segue para lugar algum

E aquele novo álbum da sua cantora favorita que é hit atrás de hit? Uma seleção perfeita… até tocar aquela horrível faixa de encerramento. Por que ela colocou aquela música ali? Estragou o disco

Nós somos obcecados com finais perfeitos. Se o fim não satisfaz nossas expectativas, consideramos que perdemos tempo. Desvalorizamos todas as cenas boas do filme, queremos arrancar das páginas da memória os capítulos do livro, e fazemos careta sempre que o ótimo disco da cantora chega na última faixa. 

Carregamos isso para todos os cantos da nossa vida. Resolvemos que o ex-namorado nunca prestou só porque o amor chegou ao fim. Concluímos que o amigo que parou de nos procurar sempre foi mesmo um falso. Procuramos com tanto afinco um final feliz, que nos privamos de aproveitar cada capítulo da história tal qual ele é. Queremos espiar por cima do muro, buscando adivinhar se o fim vai fazer valer a pena. A verdade é que o fim é algo que não controlamos. E essa falta de controle nos corrói por dentro. 

Nos decepcionamos com o final de criações artísticas porque é algo que sentimos que temos um mínimo de controle. Temos uma ideia de como o filme vai terminar, do caminho que o livro vai tomar ou de como será a faixa final do disco. O fim do namoro, o término abrupto de um emprego, o despejo de uma morada, a morte de um ente querido, tudo isso vem de surpresa. O medo da morte vem do desespero em não termos um final feliz. 

Que importância tão imensa damos ao fim. Mesmo que tenha uma sequência, mesmo que a vida continue. Porque o final é invenção nossa. Ele nunca existiu. Porque o filme segue ressoando dentro da gente. O livro, quando lido novamente, traz novas interpretações – parece até que nunca tinha sido realmente lido! E aquela faixa final do álbum… até que não é tão má assim…