
Só gravidade
Sem pressão
Eu, você e sua mão
Só gravidade
Sem pressão
Eu, você e sua mão
Em meio ao som contundente das britadeiras,
abaixo das buzinas histéricas dos carros,
rodeado dos gritos dos transeuntes,
o silêncio se achou o máximo.
Em ondas de areia clara e escura, eu surfo. Não fujo do passado, mas passo raspando, passando a mão na areia sem me comprometer. É um afago no eu pretérito, não um colo. Minha prancha segue firme e inabalável. Até eu cair, é claro. Ah, sim, eu caio. Mas como o carinha do Pitfall, eu encontro uma nova vida, pulo a areia movediça e sigo. Porque futuro é isso: uma vida extra. Não é sequência do presente, até porque o presente já era. Futuro é horizonte. É pra lá que eu surfo. Sem enxergar bem o que tem naquela linha distante. Pode ser praia, ilha, pirata ou sereia. Quem sabe uma baleia? Só sei que não é o que ficou pra trás. Poderia ser. Não quero. Quero envelhecer rejuvenescendo. Quero me embriagar de lucidez. Montar num cavalo marinho e brincar de ser mais eu. Eu agora, não eu pretérito. Precisamos todos rejuvenescer. Surfando nas areias do tempo. Caindo. Vida extra. Rumo a uma inalcançável linha que – veja bem – fica logo ali.
Era janeiro e, pela frente, o ano inteiro
Em fevereiro, meu coração cabreiro
Já é abril, e meu pé nem viu
O samba atrasou,
mas quando chegou…
presidente
c
a
i
u
.
Do conforto da escuridão, foi puxada para a claridade.
Ganhou essa missão ingrata de nascer primeiro.
Tateou, cheirou, lambeu, escutou e observou.
“Tá limpo, galera! Bora!”
Serviu de compasso para os irmãos.
Ora apontando pro Norte, ora pra Sorte.
Ora Lady Leste, ora Mae West.
Rainha do Sul com império no Sudeste.
Engatinhou, caminhou, correu.
E não parou.
Segue até hoje
na direção do amanhã.
Quando não há luz, escuridão.
Onde ela existe, Clarice.
Seria tão mais fácil fingir que nada aconteceu.
Soterrar a boneca no terreno fértil da memória,
deixar o balão seguir o caminho desgovernado do destino
e aceitar as escolhas do peixinho ao nadar em busca de si.
Mas o trauma é como água na terra.
Cria o barro.
E do barro, vem a perda do equilíbrio,
vem o desmoronamento de quem se é.
Todavia o barro também cria.
Cria objetos, cria arte, cria um lar.
Para esse barro, qual seria a sina?
Está nas mãos de uma menina.
Ai, que calor ele sente!
E que leveza na carteira de dinheiro
A ironia de estar distribuindo presente
Sem ter um para o seu descendente
Ai, que tristeza ele sente!
Suou frio durante o ano inteiro
Agora o suor é deveras quente
Natal assim, não há quem aguente!
Ai, que angústia ele sente!
Pobre Papai Noel brasileiro!
Se pelo menos caísse o presidente…
Aí sim, bola pra frente!
De uma ideia, surgiu
Um mundo novo em anil
Você viu?
No teu olho, o reflexo de uma casca.
Não sou eu.
É um invólucro todo teu.
Uma imagem que reflete o que pensas de mim.
Não o que reflito eu.
Na tua mente, a silhueta de uma mentira.
Não sou eu.
É uma crosta toda tua.
Um contorno que revela tuas imagens de mim.
Não o que revelo eu.
No meu ser, sinto-me sempre despida.
Sim, sou eu.
É uma vida toda nua.
Mas teus olhos me veem e me cobrem
de cascas
de esperas
de despedidas.
Este texto foi escrito dentro do Desafio da Lagosta, que instigou a equipe do PáginaDois a produzir conteúdo partindo do inusitado tema “lagosta”.
Apesar dos pesares
Pés como penas
Eu sigo pisando