Fuga nº4: Barro

Seria tão mais fácil fingir que nada aconteceu.
Soterrar a boneca no terreno fértil da memória,
deixar o balão seguir o caminho desgovernado do destino
e aceitar as escolhas do peixinho ao nadar em busca de si.

Mas o trauma é como água na terra.
Cria o barro.
E do barro, vem a perda do equilíbrio,
vem o desmoronamento de quem se é.

Todavia o barro também cria.
Cria objetos, cria arte, cria um lar.
Para esse barro, qual seria a sina?
Está nas mãos de uma menina.

Fuga nº3: Chama

Fuga_nº3:_Chama

– Caiu. – Disse ele com ar de besta.

A mãe, protetora como sempre,
concordou e defendeu o pequenino:

– Foi sem querer, minha querida.

Mas a menina fitava fixamente a lareira.

Enxergava os fios loiros de lã ardendo nas chamas,
o petit pois do vestidinho transformando-se em um triste cinza
e os olhinhos cor de mel derramando-se em lágrimas de plástico.

E podia ter certeza que algo queimava dentro dela também.

Fuga nº2: Céu

Fuga_nº2:_Céu

O balão era de um laranja tão vibrante
que era impossível perdê-lo de vista.

Metros e metros de uma subida incansável
de um laranja risonho e debochado.

Longos minutos de uma frustração berrante
ilustrada pelos olhos molhados de uma menina.

Imprimiu seu pensamento no vento,
ferindo ardorosamente alguns ouvidos da terceira idade.

E jurou vingança.