por Cassiano Rodka
“O que você faz?”, foi o que ele prontamente me perguntou.
– Eu costumo fazer o que tenho vontade. Mas sempre chegam as contas e os telefonemas inoportunos e os compromissos sociais… Eu faço um prato que chamo de Lasanha Rio-Grandense, pois os ingredientes são pimentões vermelhos, amarelos e verdes. Eu paro o tempo do micro-ondas um ou dois segundos antes de terminar para evitar aquele bip bip bip irritante. Cheiro minhas mãos várias vezes após refeições manuais para conferir se lavei o suficiente a ponto de eliminar completamente o odor da comida. Eu vou no banheiro de 15 em 15 minutos depois de beber muita cerveja. Mato mosquitos com uma só mão – e me orgulho disso. Falo sozinho em inglês às vezes; muitas vezes faço um sotaque estrangeiro, só pela diversão. Confiro diversas vezes o que carrego no bolso e redistribuo os itens de acordo com função ou peso. Olho várias vezes o rótulo de um bom vinho tentando gravá-lo na memória, mas depois nunca lembro se gostei dele ou não. Quando pego o violão, costumo tocar um Mi ou um Dó para conferir se está afinado. Me alongo toda hora balançando os meus braços para trás e para frente. Constantemente procuro novos músicos e bandas, e mergulho profundamente no universo dos artistas que estou descobrindo. Aliás, isso serve para qualquer forma de arte. Quando eu amo, eu devoro. Sempre peço uma garrafa a mais de vinho do que deveria. Se bebo demais, acabo saindo das festas sem me despedir das pessoas. Mas sempre aviso pelo menos um amigo. Não sei costurar papo furado. Se estou entediado, está estampado na minha cara. Não rio quando não acho graça, mas não é de propósito, eu não consigo fingir mesmo. Em contrapartida, eu rio de coisas bestas. Acho a vida, no geral, engraçada de se observar. Falo pouco e as pessoas acabam me achando antipático. Acho muito mais simpático escutar do que não calar a boca, mas não tem jeito, elas esperam que eu fale mais. Quando destacam meu silêncio, eu fico mais quieto ainda. Sou super leal e acabo exigindo a mesma lealdade de volta. Fico puto se alguém que eu prezo me deixa na mão. Leio sempre o nome no crachá dos atendentes de caixa dos supermercados ou dos taxistas, isso humaniza, de alguma forma, a relação fugaz que tenho com eles. Choro sem vergonha alguma em plena sala de cinema ou escutando música no ônibus. Vejo malícia em tudo que é frase de filme ou programa de TV. Adoro escutar o que está tocando no supermercado. Sempre treino na minha cabeça aquilo que vou pedir para o caixa do banco enquanto estou na fila esperando, como se fosse esquecer o que eu preciso quando chegar a minha vez. Pensando bem, faço isso no aeroporto, no mercadinho ou em qualquer outra fila. Quando a música da festa está chata, eu canto uma que eu goste na minha cabeça em cima da batida. Eu danço usando muito as mãos, fazendo maracas invisíveis ou apontando para os cantos. Eu sempre cuspo na patente antes de fazer xixi. Eu me incomodo em pular ou interromper músicas que eu gosto, mesmo que o táxi tenha chegado, parece um desrespeito. Eu invento palavras que não significam nada em específico. Eu dificilmente chamo uma pessoa pelo apelido. Eu adoro receber amigos em casa. Eu faço o melhor Bloody Mary que eu já tomei. Eu não sou modesto, mas costumo desvalorizar o que eu faço. Eu sou super tímido, mas me sinto mega à vontade num palco. Eu sempre faço muitos planos, e constantemente me cobro a realização de cada um deles. Às vezes levo anos para realizá-los, mas isso nunca me incomoda. Eu não levo o tempo muito a sério. Eu não tenho medo de morrer, mas envelhecer me assusta. Costumo me imaginar morrendo ao salvar alguém heroicamente, mas acho que vou morrer de algum problema respiratório. Não consigo entender como alguém que não acredita em Papai Noel acredita em Deus. Arroto com toda força e turbulência possível quando estou sozinho. Sempre faço 500ml de café passado, mesmo que a maioria das vezes não tome tudo. Me dedico de coração a uma relação quando estou apaixonado, mas consigo sair facilmente dela quando sinto que entrei numa fria. Eu lembro das datas dos aniversários das pessoas que eu amo. Mas esqueço se me perguntarem. Eu adoro comprar camisetas e casacos, odeio comprar tênis e calças. Tenho uma mania de mexer nas unhas que, para mim, é como respirar. Sou super calmo, mas quando alguém me tira do sério eu sou capaz de traumatizar psicologicamente a pessoa pro resto da vida. Eu sou um apaixonado pela vida. Acho isso aqui incrível, não consigo me imaginar perdendo o interesse. Eu sinto-me estranhamente confortável com a instabilidade. Eu acredito que a beleza da vida está em saber lidar com as cartas em mãos. E não necessariamente fazer sequências ou full-hands, mas dobrá-las em origamis ou empilhá-las em castelos ou até mesmo queimá-las. Eu gosto de fazer o que eu teoricamente não poderia. Eu escrevo sem nunca considerar que o texto será lido. Depois vejo se dá para colocar no ar. Eu faço o que eu sinto que tenho que fazer.
E você?
“Eu sou advogado”, disse ele enquanto se levantava e deixava o bar.